– Entidades discutem o assunto, mas não há proposta para aliviar as mortes: só nos EUA são 40 por ano

– Segundo o Contran, não é o caso de criar campanha ou legislação: “é caso de polícia”

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Aconteceu uma vez, duas, três, quatro, e apesar da comoção causada pelas mortes de bebês esquecidos no banco de trás do carro, esse tipo de acidente continua a se repetir. Não se trata de um problema brasileiro: só nos EUA quase 40 crianças morrem por ano dessa forma.

Mas as recentes mortes no Brasil – três só em dezembro de 2014, sendo duas no mesmo dia, 17 – assustaram a sociedade e levantam a discussão sobre a necessidade de se criar alternativas para evitá-las.

Nos EUA, estima-se que pouco mais da metade das mortes de crianças por hipertermia ocorreu por esquecimento dos pais. O restante por outros motivos, como crianças que entraram no carro sem que ninguém percebesse e ficaram presas. Há casos de pais que não quiseram acordar a criança ou que pretendiam voltar em alguns minutos. E acidentes, como o ocorrido nesta quarta-feira no Rio de Janeiro, quando a mãe trancou o carro com o filho e a chave dentro. Felizmente a criança foi resgatada a tempo por guardas municipais acionados por uma mulher que presenciou o desespero da mãe. O vidro foi quebrado e a criança retirada do carro.

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Exposto ao sol, o carro chega rapidamente a uma temperatura 20 graus mais alta do que a temperatura externa.

A indústria se preocupa com o assunto, mas por enquanto não existe nenhum projeto em andamento. No ano passado, o tema foi colocado numa reunião da Anfavea, a associação dos fabricantes de veículos, mas não foi levado adiante.

Os engenheiros automobilísticos reunidos na sua associação, a AEA, também levantaram a discussão, mas nenhuma proposta foi apresentada. Associação informou que costuma dar andamento a demandas a partir de uma sinalização do governo, o que não ocorreu até agora.

Segundo a AEA o governo chegou a sinalizar a realização de uma campanha educativa para pais e motoristas não esquecerem bebês e pessoas incapazes no carro, mas o projeto não vingou.

O Denatran entende que esse tipo de acidente não leva à realização de campanhas. “Nós trabalhamos apenas com a vertente de campanhas voltadas para as regras de trânsito previstas no Código de Trânsito Brasileiro”, informou um representante do Ministério das Cidades.

Maria Cristina Alcantara Andrade Hoffmann, coordenadora de Qualificação do Fator Humano no Trânsito do Contran, disse ao repórter Caio Bednarski que o papel da entidade é regulamentar as leis de trânsito e que esse assunto não se enquadra no tema. “Parece mais caso de policia”, disse.

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Edson Oriksa, presidente da AEA, lembra que uma campanha de conscientização seria a melhor alternativa neste momento, uma vez que um projeto de introdução de um novo equipamento para salvar crianças esquecidas no carro levaria anos para ser integrado na produção. O uso do airbag e ABS – obrigatório desde 2014 – demorou mais de quatro anos para ser aprovado.

Mas já tem gente de olho numa solução para o problema. Um inventor procurou a AEA com a proposta de instalar um sensor que acusa a presença da criança ou qualquer pessoa através de um sensor de peso. Sensor de peso não é novidade, alguns carros já o possuem, inclusive para passageiros. O sensor de criança na cadeirinha, ou no banco traseiro, viria conjugado com outros sensores, de presença e de movimento.

“O problema requer estudo mais aprofundado, acha Nilton. Qualquer que seja a alternativa, a sua eficiência vai depender da atenção do motorista: a criança poderá sair da cadeirinha, deitar no banco, desatar o cinto. São muitos os pontos vulneráveis. Se a pessoa esquece a criança no carro, poderia também esquecer de colocar a cadeirinha ou de acionar o cinto ou o alarme”, considerou.

Diretor técnico da AEA, Marcos Vinícius Aguiar confirmou que não se cogita a obrigatoriedade da instalação de um sensor ou qualquer outro sistema que alerte o motorista sobre a presença do bebê no banco traseiro, embora o assunto já tenha sido objeto de discussão tanto no âmbito da associação quanto no Denatran.

“O problema já foi tratado internacionalmente, inclusive a NHTSA (o órgão de trânsito estadunidense) discutiu o assunto, mas a opção foi fazer campanhas educativas em vez de obrigar a indústria a produzir um equipamento”, disse Marcos Vinícius, confirmando que a discussão não está circunscrita ao Brasil, mas é preocupação de vários países.Nos Estados Unidos não há regulamentação nesse sentido, assim como em países europeus.

Marcos concorda que a melhor ação neste momento é a realização de campanhas, através do governo, de conscientização para evitar esse tipo de acidente.

“Acho que a indústria tem que discutir o assunto, mas o maior problema é a educação, por isso o mais indicado é fazer uma campanha para que o motorista fique mais atento quando estiver transportando uma criança”, disse Marcus, que também é diretor de Assuntos Institucionais da Renault do Brasil. Ele reforça que o equipamento não basta:

“Mesmo com sensor no cinto de segurança, tem motorista que não usa; até coloca clip para eliminar o sinal sonoro e dirige sem o cinto”.

Talvez uma alternativa seria a instalação de um sensor na própria cadeirinha onde a criança vai sentada. Mas o representante da empresa Burigotto, uma das maiores fabricantes de cadeirinhas de criança para carro, desconhece qualquer preocupação da indústria em relação ao assunto.

No ano passado, a associação de consumidores Proteste fez uma avaliação das cadeirinhas de bebês, mas não foi considerada a questão do esquecimento de crianças no carro. A propósito, o teste revelou que nenhuma das cadeirinhas vendidas no Brasil obteve nota acima de três, numa escala de zero as cinco.

O problema, segundo especialistas, é anterior: é preciso conscientizar o usuário na necessidade da cadeirinha e do cinto de segurança, assim como ensiná-lo a usar o equipamento adequado para cada idade, pois tem gente que não sabe nem afivelar a cadeirinha e nem usa o cinto.

Além disso, a indústria brasileira não se arriscaria e desenvolver um sistema de segurança que não existe em nenhum lugar do mundo. Uma exigência desse tipo criaria problemas e aumento de custo na legalização de carros importados. Um custo muito alto – acham especialistas – para pouca demanda.