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Aumentou a pressão da indústria automobilística nos últimos dias junto ao governo para que seja mantida a sobretaxa dos carros importados. O porta voz da vez é o presidente da Mercedes-Benz do Brasil, Phillip Schiemer, que pegou pesado numa entrevista ao Estadão na semana passada.

O executivo alardeou que “quase todas as indústrias no Brasil fecharão as portas”, caso ocorra uma abertura do mercado. A declaração alarmista lembra os melhores momentos da oposição a Lula, quando, às vésperas da sua primeira eleição, em 2003, dizia que a indústria abandonaria o País caso ele fosse eleito. Ou, para ficar no âmbito do setor, quando da saia justa do então presidente da Anfavea, Cledorvino Belini, que teve que explicar a decisão do governo, em 15 de setembro de 2011, de sobretaxar os carros importados em 30 pontos percentuais no IPI porque a indústria estava com medo da “invasão” dos estrangeiros.

Outra passagem foi a pretensa “invasão chinesa”, logo após a chegada da JAC, que trouxe carros completos a preços mais baratos do que concorrentes nacionais, isso pagando já a alíquota máxima de importação, de 35%. Um levantamento feito na época mostrou que as vendas de todas as marcas chinesas no Brasil juntas eram inferiores às da Kombi, o que evidenciava o exagero das declarações dos representantes da indústria, da mesma forma que está ocorrendo hoje.

Quando fala sobre uma “abertura do mercado” Phillip Schiemer se refere ao fim da taxação extra dos importados, de 30 pontos percentuais, o que já estava previsto desde outubro de 2012, quando foi iniciado o projeto Inovar Auto, que se encerra no próximo dia 31. Não se trata, portanto, de “falta de previsibilidade”, como ele diz. Todos os chamados newcomers – Audi, BMW, Land Rover e a própria Mercedes-Benz – já sabiam que o Inovar Auto se encerraria este ano.

Por traz do pronunciamento do presidente da Mercedes-Benz estão, em primeiro lugar, a tentativa da indústria de manter seus privilégios, eliminando a concorrência, e em segundo lugar, a busca por justificar um eventual erro estratégico, de ter montado uma fábrica no Brasil num momento de baixa do mercado.

O fraco desempenho de vendas da Mercedes-Benz no mercado brasileiro não é resultado da concorrência com as marcas estrangeiras, mas sim do mercado geral, que está operando abaixo dos recordes registrados em 2013, quando a empresa decidiu investir no Brasil. Mesmo depois de iniciada a crise, as vendas gerais foram caindo, enquanto as vendas de carros premium (onde a Mercedes-Benz atua) cresciam com consistência, o que animou os fabricantes de carros de luxo. Mas a situação mudou e certamente a Mercedes-Benz se arrependeu de ter construído a fábrica de Iracemápolis naquele momento, que hoje opera bem abaixo da sua capacidade.

Em 2013, quando a pedido da indústria o governo sobre taxou as importadoras, a participação dos carros importados no mercado brasileiro era de 25%, mas a maioria era importada pelos fabricantes instalados no Brasil. Os filiados à Abeifa (que reúne os importadores sem fábrica no Brasil), eram responsáveis por apenas 5,8% das vendas.

Hoje, cinco anos após a ceifada aos importadores, os carros estrangeiros representam cerca de 11% do mercado interno, sendo que a imensa maioria continua sendo trazida pelos fabricantes. Para os importadores sobram miseráveis 1,3%, ou cerca de vinte e sete mil carros.

Essa história de deixar o País é conversa fiada: a indústria não quer perder espaço e por isso reclama, chora junto ao governo, e costuma ser atendida. Mas é claro que ninguém vai largar o osso de fabricar carros no Brasil, país que tem um enorme potencial de crescimento e que permite uma margem de lucro maior do que qualquer outro lugar no mundo. Ou será pelos belos olhos dos brasileiros que quase todas (se não todas) as grandes empresas do mundo estão instaladas no Brasil?